Para atrair mais empreiteiras pequenas e médias, o governo resolveu fazer novas mudanças nos próximos leilões de rodovias federais. A partir de agora, não haverá mais nenhuma exigência de patrimônio líquido mínimo para quem quiser entrar nas disputas.
O objetivo é remover entraves para a participação de grupos menores nos leilões, bem como de empresas estrangeiras, conforme explicou ao Valor a secretária-executiva do Ministério dos Transportes, Natália Marcassa.
Na última rodada de concessões de estradas, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) definiu um valor mínimo de patrimônio líquido para habilitar empresas interessadas nos leilões. Esse montante ficava entre R$ 400 milhões e R$ 870 milhões, dependendo dos investimentos no trecho oferecido à iniciativa privada. A mesma exigência estava na minuta de edital da Rodovia do Frango, um corredor logístico de 460 quilômetros no Paraná e em Santa Catarina, que foi discutida com investidores em audiência pública e estabelecia um valor de R$ 430 milhões.
Na nova versão do edital, que foi enviada ao Tribunal de Contas da União (TCU) na segunda-feira, o governo abriu mão da cláusula de patrimônio líquido. A decisão valerá para os 14 outros lotes de rodovias que o governo quer leiloar até o fim de 2016. De acordo com Natália, essa mudança não foi motivada pela Operação Lava-Jato, mas reflete um estímulo à maior concorrência nos leilões.
À exceção da BR-050, assumida por um “pool” de dez construtoras de pequeno ou médio porte, todas as concessões de rodovias feitas entre 2013 e 2014 foram arrematadas pelos grandes grupos nacionais – boa parte controlados por empresas envolvidas na Lava-Jato. O patrimônio líquido era visto como uma barreira à diversificação dos concorrentes. Empreiteiras menores teriam dificuldades em atingir os valores mínimos exigidos pelo governo. Enquanto isso, as estrangeiras costumam ter um nível de endividamento mais alto e patrimônio menor nos balanços.
“Com essa tacada, o governo toma uma boa iniciativa”, diz o presidente da comissão de obras públicas da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Carlos Eduardo Lima Jorge. Ele considera que, para o sucesso da segunda etapa do programa de concessões, não se pode manter a dependência das gigantes do setor. “Há claramente uma necessidade de abrir espaço para os grupos médios”, enfatiza Lima Jorge.
O executivo afirma que já esperava uma redução da exigência de patrimônio líquido, mas não o fim da cláusula. “Isso ajuda as empresas menores daqui e facilita a entrada de companhias de fora”, acrescenta. Segundo ele, é nítido o interesse das construtoras pequenas e médias nos leilões de rodovias, inclusive como forma de gerar novas fontes de receitas. “Quem depende de recursos do OGU [Orçamento Geral da União] ficou a ver navios.”
Lima Jorge expõe, no entanto, uma preocupação: não escancarar as portas para construtoras estrangeiras e prescindir das empresas nacionais. “O ideal seria fomentar condições para trabalhemos em parceria”, pondera.
Para o especialista em infraestrutura Luís Felipe Valerim Pinheiro, sócio do VPBG Advogados, a retirada da exigência de patrimônio líquido deve mesmo aumentar a concorrência e diminuir a barreira de entrada para estrangeiros nos leilões. Sem outros mecanismos que garantam a presença de empresas saudáveis nos certames, porém, corre-se o risco de deixar as futuras concessões nas mãos de “aventureiros”.
“O importante é não fragilizar a execução do contrato. É preciso tomar outras precauções”, diz Valerim, que era coordenador da área de infraestrutura e energia na Casa Civil durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff. Ele integrava a equipe que discutia a elaboração de boa parte dos editais dos leilões de 2013 e 2014.
A secretária-executiva afirma que o governo está tomando uma série de cuidados para evitar riscos de não execução contratual. Segue válida, por exemplo, a obrigatoriedade de apresentação de garantias financeiras que endossem as propostas feitas nos leilões. Isso pode ser feito por meio de seguro ou de fiança bancária.
Também continua intocada a necessidade de aporte significativo para capitalizar as sociedades de propósito específico (SPEs) que assumem as concessões. No caso da Rodovia do Frango, a integralização de capital exigida é de R$ 200 milhões – R$ 138 milhões na assinatura do contrato e o restante até um ano após a concessão.
Para leiloar esse lote, o governo ainda depende de aval do TCU. A tarifa máxima de pedágio foi fixada em R$ 14,62 por cada 100 quilômetros e aposta-se na concorrência para diminuí-la.
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