Lei do Motorista: Decisão do STF deve provocar efeitos em todo o setor produtivo

Por esta razão, ponderam os participantes desta matéria especial, as empresas que atuam no setor precisarão se adaptar e assimilar as novas regras o mais rápido possível, inclusive sob pena de acarretar considerável passivo trabalhista.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual concluída no último dia 30 de junho de 2023, julgou, por maioria de votos, inconstitucionais alguns artigos da Lei dos Caminhoneiros – Lei 13.103/2015 – na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5322. A inconstitucionalidade foi reconhecida na integralidade de alguns dispositivos e em certos trechos de outros.

Na verdade, o STF, em decisão colegiada – 8 anos após a aprovação da Lei 13.103, em 2015 – decidiu acolher parcialmente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5322) protocolada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres – CNTTT, considerando inconstitucionais diversos pontos que dispõem sobre a jornada de trabalho e o tempo de descanso do motorista.

Neme, da Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso: a alteração da legislação tem impacto direto na jornada de trabalho do empregado, e demandará considerável oneração da folha de pagamento dos empregadores

“As alterações estão relacionadas, basicamente, à jornada de trabalho, pausas para descanso, repouso semanal e fracionamento de intervalo, sendo necessária análise mais aprofundada das consequências quando o referido acórdão for publicado. Por envolver a jornada de trabalho do empregado motorista, as mudanças tendem a produzir enormes impactos em todo o setor produtivo, razão pela qual as empresas precisarão se adaptar e assimilar as novas regras o mais rápido possível, inclusive sob pena de acarretar considerável passivo trabalhista. Ainda, será imprescindível uma assessoria jurídica competente, tanto para instrui-las no que tange às alterações promovidas, quanto para, eventualmente, pedir a revisão de contratos empresariais.” A constatação é de Jader Solano Neme, advogado do escritório Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso, empresa com expertise na elaboração de estratégias preventivas e/ou litigiosas nas áreas trabalhista, tributária, civil, empresarial, bancária, comercial, ambiental, penal e do agronegócio.

Leonardo Benitez, sócio-diretor da Connexxion Consulting, consultoria especializada em logística e Supply Chain, também esclarece que, dos 20 temas avaliados na Lei do Motorista, quatro foram considerados inconstitucionais: a) tempo de espera; b) fracionamento ou acúmulo do descanso semanal remunerado; c) fracionamento do intervalo de descanso das 11 horas nas 24 horas; d) tempo de repouso de dupla de motoristas feito com o veículo em movimento.

A) Tempo de espera;

A CLT estabelecia que o tempo de espera do motorista ocorria enquanto aguardava as operações de carga e descarga ou em filas para fiscalização de mercadorias. Esse período não era computado na jornada de trabalho. Embora não fosse considerado como tempo efetivamente trabalhado, o tempo de espera era indenizado em 30% do valor da hora normal. Durante esse tempo, o motorista ficava parado ou descansando, aguardando ser chamado para realizar a carga ou descarga ou ser fiscalizado.

Com a decisão, as empresas perderam dois aspectos na gestão do negócio: o primeiro foi a possibilidade de controlar o tempo efetivo de trabalho e a flexibilidade na execução dos serviços.

“Veja por exemplo um processo de carga ou descarga comum em uma operação de Centro de Distribuição de um varejo alimentar. O processo pode durar de 2 a 4 horas apenas na fila para ser iniciado, sem efetiva produção. Com a revisão, estas quatro horas serão computadas na jornada, e remuneradas em 100% conforme CLT, e não em 30% como verba indenizatória”, alerta Benitez.

Ou seja, além de pagar por horas improdutivas, o valor pago é bem maior do que o atual, fato que deve impactar diretamente no frete. Além disso, vai gerar mais incertezas no planejamento do descanso dos motoristas

B) Fracionamento ou acúmulo do descanso semanal remunerado;

O acúmulo do descanso semanal remunerado permitia aos motoristas de viagens de longa distância usufruir do seu descanso semanal quando retornassem à sua base e residência, aspecto essencial para que pudessem estar junto aos seus familiares. Podiam acumular até três descansos semanais, item amplamente aceito por todos os motoristas. A decisão do STF determina que o descanso semanal seja aplicado da mesma forma que nas outras categorias, ou seja, após seis dias consecutivos de trabalho. Isso significa que, mesmo durante viagens longas, os motoristas terão de ficar parados em algum posto de serviço.

C) Fracionamento do intervalo de descanso das 11 horas nas 24 horas;

O STF declarou inconstitucional dividir o período de descanso dos motoristas, e a coincidência do descanso com a parada obrigatória na condução do veículo. A partir de agora, os motoristas devem ficar parados por 11 horas consecutivas dentro das 24 horas no ponto de parada, geralmente um posto de serviço, mesmo se estiverem próximos a sua residência e família.

“Estes últimos dois pontos impactam diretamente no interesse de se trabalhar como motorista. O fato de estar longe da família e com a segurança e qualidade de vida potencialmente comprometidas, pode impactar na oferta de mão de-obra.”

D) Repouso com veículo em movimento

Nas viagens de longas distâncias em que o empregador contratar dois motoristas, o STF declarou inconstitucional contabilizar o tempo de descanso de um dos motoristas com o caminhão em movimento, com repouso mínimo de seis horas em alojamento ou na cabine leito com o veículo estacionado, a cada 72 horas.

Agora, o tempo em que um motorista está dirigindo e o está outro dormindo na cama da cabine ou descansando é considerado como jornada de trabalho. Isto significa que, se o caminhão trafegar por 12 horas, mesmo que cada motorista dirija por apenas 6 horas, serão computadas 12 horas de trabalho para cada profissional.

Nesse modelo, a utilização de 2 motoristas na viagem deixa de ser interessante para as empresas transportadoras, pois pagariam por tempo improdutivo do motorista em descanso, bem como para os motoristas que teriam que parar para descanso em momentos que poderiam estar em trânsito para encontrar com a família.

“A imposição de condições de trabalho mais restritivas torna a função menos atrativa para novos candidatos. O setor já tem dificuldade de encontrar motoristas”, alerta Benitez, da Connexxion

“A imposição de condições de trabalho mais restritivas torna a função menos atrativa para novos candidatos. O setor já tem dificuldade de encontrar motoristas, tanto que o SEST/SENAT custeia a carteira de motorista D e E para profissionais de outras áreas do transporte que querem migrar de atividade. Os custos do transporte devem sofrer alto impacto, e necessariamente deverão ser compensados através de renegociação dos contratos em toda a cadeia de suprimentos. O equilíbrio obtido com a Lei dos Motoristas no passado pode sofrer grande revés. A falta de segurança jurídica no setor, o aumento dos custos, o aumento da violência nas estradas e a falta de investimento adequado nas rodovias geram um clima de insegurança e desestimulam o setor”, alerta o sócio-diretor da Connexxion sobre as consequências destas alterações feitas pelo STF.

Mirella Pedrol Franco, coordenadora da área trabalhista consultiva e contenciosa na Granito, Boneli e Andery – GBA Advogados Associados, escritório com foco em Direito Empresarial, lembra que o Art. 235-C, §8º, da CLT, criado pela Lei 13.103, previa que o tempo de espera, assim considerado aquele em que o motorista aguarda as operações de carga ou descarga e o período gasto com a fila para fiscalização de mercadoria, em barreiras fiscais ou aduaneiras, não deveria ser computado na jornada de trabalho, de maneira a permitir que o tempo de jornada/direção fosse preservado. Isto permitia que, após carregar, descarregar ou atravessar uma barreira, o motorista pudesse seguir viagem, sem incluir na jornada as horas de fila (espera). “Com as alterações da Lei, todas essas fases passam a ser computadas como jornada de trabalho. Isso certamente traz impactos financeiros para as empresas, pois com a decisão que declara a inconstitucionalidade do dispositivo, elas perderam dois benefícios: i) o de poder trafegar mais tempo, já que o tempo de espera não se computava na jornada de trabalho; ii) pagar pelo tempo de espera um valor menor que o da hora comum e como verba indenizatória, sem encargos.”

“Dependendo das operações de transporte e logística, essa mudança tratará forte impacto no custo do frete, pressionando a inflação em toda a cadeia produtiva”, diz Mirella, da GBA Advogados Associados

Ainda segundo Mirella, dependendo das operações de transporte e logística, essa mudança tratará forte impacto no custo do frete, encarecendo a operação e, consequentemente, pressionando a inflação em toda a cadeia produtiva. Além do custo direto com o pagamento do tempo em fila igual ao efetivamente trabalhado, as viagens de ponto a ponto serão mais lentas, pois o tempo de efetivo tráfego, em cada jornada do motorista, será menor, já que o tempo em fila passa a ser considerado na jornada diária e nos seus limites legais.

A análise das consequências destas alterações feita por Fernando Akira, Gerente Operacional no Grupo IBL – com forte atuação no segmento logístico – também é feita de acordo com os tópicos.

– Tempo de espera é considerado hora trabalhada. “O tempo de espera era remunerado em 30% do valor da hora trabalhada e com a mudança estima-se um aumento do custo do transporte”;

– Restrição referente ao fracionamento do intervalo entre jornada. “Era permitido fracionar das 11:00 da jornada 3 horas e com a mudança há previsão de aumento considerável no tempo de entrega da mercadoria e, consequentemente, aumento de custo no transporte.” Neste tópico, Narciso Figueirôa Junior, assessor jurídico da NTC & Logística, também se manifesta. Segundo ele, as consequências são nefastas para as operações de transporte e no que tange à impossibilidade de fracionamento do intervalo interjornada de 11 horas e de cumulatividade dos descansos semanais remunerados em até 3, também prejudicial aos motoristas, pois terão que gozar os intervalos de forma ininterrupta onde estiverem, ficando mais tempo longe da família e as viagens terão mais tempo de duração.”

Figueirôa Junior, da NTC & Logística: haverá aumento do custo do transporte, já que as viagens demorarão mais para serem concluídas, e queda na produtividade, e o TRC não pode arcar sozinho com este aumento de custo

– Descanso semanal deve ser realizado a cada 6 dias trabalhados. “Era permitido o acúmulo dos descansos para serem usufruídos posteriormente. Com isso, para viagens longas o prazo de entrega aumenta e para os motoristas que moram longe, isso dificulta muito a possibilidade de descanso em sua residência”, diz Akira;

– Restrição referente ao descanso em trânsito em caso de jornada dupla. “Era permitido que, enquanto um motorista dirigia o outro descansava em trânsito. Com a mudança, só será considerado o descanso com o veículo parado. Mediante a mudança estima-se o aumento no custo do transporte, a cadeia de suprimentos será afetada, assim como a segurança de cargas de valor agregado alto”, completa o gerente operacional do Grupo IBL.

Meyer, do Instituto Cordial: Para o sistema logístico como um todo, se fará necessário um planejamento mais eficiente das operações para evitar o aumento excessivo de gastos com a empresa transportadora

Já para Luis Fernando Villaça Meyer, diretor de operações do Instituto Cordial – think and do tank independente que trabalha com ciência de dados, inteligência territorial e articulação intersetorial para fortalecer redes e basear tomadas de decisão públicas e privadas em dados e evidências – e responsável pelo Painel Brasileiro da Mobilidade – iniciativa do Instituto Cordial em escala nacional que busca contribuir para o desenvolvimento de uma mobilidade mais acessível, segura e sustentável no Brasil –, estas mudanças vão implicar em alterações nos custos e na operação de empresas do setor, que terão de gerenciar de forma mais eficiente as jornadas de trabalho e o tempo de carga e descarga.

“Por outro lado, devem ter impacto positivo para os motoristas e para redução de acidentes nas rodovias brasileiras. A saúde dos motoristas profissionais, a remuneração e o consumo de substâncias estimulantes, lícitas e ilícitas, para cumprir longos percursos aparecem como grandes fatores de risco para a segurança rodoviária. Depois da queda significativa de acidentes e mortes em rodovias federais brasileiras de 2013 a 2018, temos visto desde aquele ano até 2022 uma estagnação na queda, com mais de 5 mil pessoas morrendo anualmente nas rodovias do país, de acordo com dados da Polícia Rodoviária Federal. As alterações podem contribuir para que esse número seja reduzido ao melhorar a qualidade do descanso e a remuneração do motorista”, pontua Meyer.

“Vai ter que haver um ajuste entre pedidos e estoque. Talvez não seja necessário aumentar o estoque, mas vai ser preciso fazer pedidos com mais frequência”, aponta Depentor, do SETCESP. Santos, do Grupo TGA: o Brasil não possui infraestrutura adequada para cumprir com as exigências de descanso estabelecidas, o que pode gerar sérios problemas a curto prazo para toda a cadeia logística

Também para Adriano Depentor, presidente do conselho superior e de administração do SETCESP – Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região, as consequências são o aumento de custo, diminuição da produtividade e aumento de ativos.

Pontos considerados inconstitucionais

Decisão do STF sobre a InconstitucionalidadeComo é a previsão legal?Comentário:
(a) por maioria, a expressão “sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de 8 (oito) horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16 (dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período”, prevista na parte final do § 3º do art. 235-C  § 3o Dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas, são asseguradas 11 (onze) horas de descanso, sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de 8 (oito) horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16 (dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período. (Redação dada pela Lei nº 13.103, de 2015) (Vigência)  Com base na consideração de que o descanso não pode ser fracionado.
(b) por maioria, a expressão “não sendo computadas como jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias”, prevista na parte final do § 8º do art. 235-C  § 8o São consideradas tempo de espera as horas em que o motorista profissional empregado ficar aguardando carga ou descarga do veículo nas dependências do embarcador ou do destinatário e o período gasto com a fiscalização da mercadoria transportada em barreiras fiscais ou alfandegárias, não sendo computados como jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias.Com base que o tempo de espera foi considerado pelo STF como jornada de trabalho e deve ser considerada dentro da jornada de trabalho e se ultrapassar será considerado como hora extra.
(c) por unanimidade, a expressão “e o tempo de espera”, disposta na parte final do § 1º do art. 235-C, por arrastamento;  § 1º Será considerado como trabalho efetivo o tempo em que o motorista empregado estiver à disposição do empregador, excluídos os intervalos para refeição, repouso e descanso e o tempo de espera.Com base que o tempo de espera foi considerado pelo STF como jornada de trabalho e deve ser considerado dentro da jornada de trabalho e se ultrapassar será considerado como hora extra.
(d) por unanimidade, o § 9º do art. 235-C da CLT, sem efeito repristinatório;  § 9o As horas relativas ao tempo de espera serão indenizadas na proporção de 30% (trinta por cento) do salário-hora normal.Como o STF considerou como jornada de trabalho, o que ultrapassar o limite da jornada será considerado como hora extra com, no mínimo, 50% a mais sobre a hora normal e natureza jurídica de salário, e não de indenização.
(e) por maioria, a expressão “as quais não serão consideradas como parte da jornada de trabalho, ficando garantido, porém, o gozo do descanso de 8 (oito) horas ininterruptas aludido no § 3º” do § 12 do art. 235-C,  § 3o Dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas são asseguradas 11 (onze) horas de descanso, sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, garantido o mínimo de 8 (oito) horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16 (dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período § 12. Durante o tempo de espera, o motorista poderá realizar movimentações necessárias do veículo, as quais não serão consideradas como parte da jornada de trabalho, ficando garantido, porém, o gozo do descanso de 8 (oito) horas ininterruptas aludido no § 3o.Com base na consideração de que o descanso não pode ser fracionado.
(f) por maioria, a expressão “usufruído no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou ao seu domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do referido repouso”, constante do caput do art. 235-D,   Art. 235-D. Nas viagens de longa distância com duração superior a 7 (sete) dias, o repouso semanal será de 24 (vinte e quatro) horas por semana ou fração trabalhada, sem prejuízo do intervalo de repouso diário de 11 (onze) horas, totalizando 35 (trinta e cinco) horas, usufruído no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou ao seu domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do referido repouso.Com base na consideração de que o descanso não pode ser fracionado.
(g) por unanimidade, o § 1º do art. 235-D;  § 1o É permitido o fracionamento do repouso semanal em 2 (dois) períodos, sendo um destes de, no mínimo, 30 (trinta) horas ininterruptas, a serem cumpridos na mesma semana e em continuidade a um período de repouso diário, que deverão ser usufruídos no retorno da viagem.Com base na consideração de que o descanso não pode ser fracionado.
(h) por unanimidade, o § 2º do art. 235-D;  § 2o A cumulatividade de descansos semanais em viagens de longa distância de que trata o caputfica limitada ao número de 3 (três) descansos consecutivos.Com base na consideração de que o descanso não pode ser limitado.
(i) por unanimidade, o § 5º do art. 235-D§ 5o Nos casos em que o empregador adotar 2 (dois) motoristas trabalhando no mesmo veículo, o tempo de repouso poderá ser feito com o veículo em movimento, assegurado o repouso mínimo de 6 (seis) horas consecutivas fora do veículo em alojamento externo ou, se na cabine leito, com o veículo estacionado, a cada 72 (setenta e duas) horas.Com base na consideração de que o descanso não pode ser fracionado.
(j) por unanimidade, o inciso III do art. 235-E, todos da CLT, com a redação dada pelo art. 6º da Lei 13.103/2015;  III – nos casos em que o empregador adotar 2 (dois) motoristas no curso da mesma viagem, o descanso poderá ser feito com o veículo em movimento, respeitando-se os horários de jornada de trabalho, assegurado, após 72 (setenta e duas) horas, o repouso em alojamento externo ou, se em poltrona correspondente ao serviço de leito, com o veículo estacionado.O STF entendeu que o descanso não pode ser gozado dentro do veículo.       Pode haver fracionamento de intervalos
(k) por maioria, a expressão “que podem ser fracionadas, usufruídas no veículo e coincidir com os intervalos mencionados no § 1º, observadas no primeiro período 8 (oito) horas ininterruptas de descanso”, na forma como prevista no § 3º do art. 67-C do CTB, com redação dada pelo art. 7º da Lei 13.103/2015  Art. 67-C. É vedado ao motorista profissional dirigir por mais de 5 (cinco) horas e meia ininterruptas veículos de transporte rodoviário coletivo de passageiros ou de transporte rodoviário de cargas. § 3º O condutor é obrigado, dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas, a observar o mínimo de 11 (onze) horas de descanso, que podem ser fracionadas, usufruídas no veículo e coincidir com os intervalos mencionados no § 1o, observadas no primeiro período 8 (oito) horas ininterruptas de descanso. (Incluído pela Lei nº 13.103, de 2015)

O STF entendeu que não pode haver fracionamento de intervalos
Fonte: Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília (FPMB)

Desequilíbrio

De acordo com o Sindicato das Empresas de Transportes e Cargas de Campinas e Região – SINDICAMP, “a declaração de inconstitucionalidade da lei promove desequilíbrio em todo o segmento do transporte rodoviário de cargas com impactos financeiros, operacionais, tributários e no valor do frete. Estima-se o impacto financeiro acima de 30% nos custos das empresas, especialmente com folha de pagamento, jornada de trabalho, número de trabalhadores, equipamentos e insumos”.

De fato, para Benitez, da Connexxion, o impacto financeiro será alto e imediato. Enquanto toda a cadeia de suprimentos não se reequilibrar, os “novos” custos gerados nas filas para carga e descarga em função da ineficiência nos processos, e na necessidade de contratação de mais motoristas e veículos para suportar o atendimento da mesma malha atual, serão inevitáveis. O impacto deve ser ainda maior no transporte de longa distância. A malha logística das empresas deverá ser repensada, e um novo planejamento tático de transportes deverá ser implantado considerando as novas restrições.

Neme, da Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso, também concorda com o ponto de vista do SINDICAMP. “A alteração da legislação envolve a jornada de trabalho do empregado motorista que, por sua vez, terá impacto direto na folha de pagamento. Como exemplo, podemos citar as alterações em relação ao ‘tempo de espera’, que anteriormente não era considerado como jornada de trabalho e agora será, o que demandará a contratação de mais motoristas ou o pagamento de horas extras quando a jornada de trabalho for ultrapassada. Desta forma, evidente que os empregadores terão que suportar considerável impacto financeiro que, aliás, pode até superar o percentual mencionado pelo SINDICAMP (30%), tendo em vista as diversas modalidade de tributação das empresas em relação ao regime por elas adotado.”

Também concordando com os apontamentos, Akira, do Grupo IBL, lembra que, uma vez que impactamos no fluxo de carga de forma negativa, teremos um efeito cascata em relação ao custo no mercado. O mercado vem sofrendo há anos com a falta do profissional motorista carreteiro. Isso faz com que seja necessário mais profissionais capacitados no mercado onde o País já apresenta uma deficiência.

Outro ponto importante – ainda segundo o gerente operacional do Grupo IBL – é que com essas mudanças teremos viagens que demorariam oito dias para chegar ao destino final chegando a 11 dias, afetando inclusive a cadeia de abastecimento, aumentando a necessidade de estoque. A utilização de dois motoristas é adotada muitas vezes para atender uma falta de suprimento da linha de produção e, assim, evitando fábricas paradas. Outro exemplo seria para atender uma carga visada para roubo, com menos paradas possíveis e reduzindo o risco de furto ou roubos, impactando na cadeia de abastecimento das indústrias.

Aline, da Martorelli Advogados: a decisão do STF também traz impactos sociais, já que, com a vedação do acúmulo de intervalos e da regra anterior, os motoristas não poderão passar mais dias com a família

Aline P. Gomes, advogada da Área Trabalhista da Martorelli Advogados, é outra participante desta matéria especial que concorda com a observação do SINDICAMP. Segundo ela, a consideração do tempo de espera como trabalho efetivo e a consequente incorporação como parte da jornada de trabalho e das horas extras encarece a operação das empresas de logística, eis que o tempo de espera passa a ser computado na jornada rotineira do motorista e passa a onerar a folha de pagamento, que deverá incluir as horas extras e o adicional (que poderá ser de 50%, hipótese mínima legal, ou acima desse percentual, em caso de previsão de norma coletiva).

A decisão do STF majorou o custo com a operação de forma irrazoável, já que a carga e a descarga de um caminhão, por exemplo, podem durar mais de seis horas, além de que o tempo de fiscalização em uma barreira alfandegária pode ser superior, por ser evento incerto e imprevisível.

Além disso, a previsão antiga da Lei nº 13.103/2015 assegurava o pagamento das horas relativas ao tempo de espera na proporção de 30% do salário-hora normal. Contudo, com a decisão do STF, o tempo de espera passa a entrar na contagem da jornada de trabalho e das horas extras, que deverão ser remuneradas com o adicional legal (50%) ou normativo. 

“Nesse sentido, o cômputo do tempo de espera na jornada de trabalho aumentará o custo da jornada rotineira do motorista e da folha de pagamento, com incidência direta no recolhimento dos respectivos encargos fiscais e previdenciários.” 

Ainda segundo Aline, é importante registrar, também, que a decisão do STF não afetará somente as empresas de logística do país, mas outros setores econômicos. Inevitavelmente, com a oneração do custo operacional da logística, haverá a majoração do custo para o consumo e, por conseguinte, para as relações cíveis. O valor do frete, por exemplo, sofrerá aumento e, em sequência, a tributação incidirá de forma proporcional à majoração, o que poderá provocar uma reação de crise econômica em cadeia no setor de logística. 

Além disso, a decisão do STF também traz impactos sociais, já que, com a vedação do acúmulo de intervalos e a vedação da regra anterior, os motoristas não poderão passar mais dias com a família, em virtude da necessidade de observância da regra mínima de trinta e cinco horas (24 horas semanais + 11 horas diárias).

“Eu concordo com as considerações do SINDICAMP, porém ainda não conseguimos avaliar financeiramente o que irá trazer de custos. Podemos dizer que os principais impactos financeiros serão nas folhas de pagamentos, no número de trabalhadores e nos equipamentos”, acrescenta Depentor, do SETCESP.

Figueirôa Junior, da NTC & Logística, também apoia a avaliação do SINDICAMP. Segundo ele, os impactos nas operações e no valor do frete, aliados à queda da produtividade, serão prejudiciais às empresas, motoristas e toda a sociedade, lembrando que a impossibilidade de fracionamento do intervalo interjornada de 11 horas também afeta o motorista autônomo, na medida em que o artigo 67-C, par.3º do Código de Trânsito Brasileiro também foi declarado inconstitucional.

Ainda segundo o assessor jurídico da NTC & Logística, haverá aumento do custo do transporte porque as viagens demorarão mais para serem concluídas e haverá queda na produtividade e o setor econômico do transporte rodoviário de cargas não pode e não deve arcar sozinho com este aumento de custo. Será necessário reorganizar as operações, renegociar contratos com clientes e repassar o aumento do frete ao consumidor final, adverte.

“Particularmente eu discordo dos dispositivos declarados inconstitucionais. Acredito que o prejuízo será grande, sobretudo aos motoristas. Dependendo das operações de transporte e logística, essa mudança tratará forte impacto no custo do frete, encarecendo a operação e, consequentemente, pressionando a inflação em toda a cadeia produtiva. Além do custo direto com o pagamento do tempo em fila igual ao efetivamente trabalhado, as viagens de ponto a ponto serão mais lentas, pois o tempo de efetivo tráfego, em cada jornada do motorista, será menor, já que o tempo em fila passa a ser considerado na jornada diária e nos seus limites legais.” O comentário, agora, é de Mirella, da GBA Advogados Associados.

Para Meyer, do Instituto Cordial, com a decisão do STF, muda-se o entendimento sobre parte significativa do tempo de trabalho dos motoristas, tendo em vista a melhora da segurança viária, bem como da condição de saúde e remuneração dos profissionais. Desta forma, este tempo, que era marginalmente incorporado pelas empresas de transportes na composição de seus custos operacionais, passa a ter de ser considerado, encarecendo a operação e os valores de frete. Uma vez que a decisão do STF ocorreu 8 anos após a Lei 13.103 entrar em vigor, o setor já havia precificado as horas desta forma e vinha operando neste contexto.

“No curto prazo, com essa alteração de entendimento e contabilização das horas de trabalho, de fato a decisão gera impactos nos custos, podendo ocorrer aumento nos valores praticados no frete e possivelmente na operação das empresas de transporte até que o mercado se reequilibre, o que é normal nesse tipo de caso. O impacto financeiro, entretanto, irá variar de empresa a empresa, especialmente de acordo com a estrutura logística e tecnológica relacionada com o tempo de espera e trajetos dos motoristas”, completa o diretor de operações do Instituto Cordial.

Grande Preocupação

De acordo com o presidente do SINDICAMP, José Alberto Panzan, as novas normas da lei geram grande preocupação para o setor. “Do jeito que a lei se apresenta, tanto o transportador de cargas quanto demais esferas da sociedade sofrerão com o aumento no custeio dos serviços prestados. Com todas as regras, mudanças drásticas estruturais e logística terão de ser feitas.”

Kelly Amorim, professora de direito do Trabalho e coordenadora dos cursos de pós-graduação da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília (FPMB), concorda com esta afirmação, destacando as mudanças drásticas decorrentes de uma lei que não seguiu o que preceituam as questões trabalhistas e foi considerada inconstitucional. Por isso as Leis devem ser muito bem discutidas para não haver decretação de inconstitucionalidade posterior.

Neme, da Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso, lembra que a alteração da legislação, como já mencionado, tem impacto direto na jornada de trabalho do empregado, o que demandará considerável oneração da folha de pagamento dos empregadores. “Contudo, as mudanças não afetam somente a folha de pagamento dos empregadores, mas o país como um todo, uma vez que o Brasil não oferece infraestrutura adequada para o cumprimento da legislação. Como exemplo, destacamos que anteriormente era permitida a fruição do período de descaso revezando a direção com outro colega de trabalho. Entretanto, com a mudança da legislação, o motorista deverá respeitar a parada para fazer o respectivo descanso, e, devido à extensa malha rodoviária e à falta de investimentos públicos e privados, podemos questionar como o motorista conseguirá cumprir tal dispositivo da legislação.”

Mirella, da GBA Advogados Associados, também lembra que, certamente, as empresas terão que rever suas operações, o que não é uma tarefa fácil. Precisarão fazer simulações de rodagem, alinhando carregamentos (tipo de cargas), tempo de rodagem, novas formas de controle de jornada e é importante, também, que as empresas avaliem a possibilidade de implementação de sistemas de geolocalização, para que possam confrontar as informações de ponto com a real localização do motorista.

Aumento do custeio – Respondendo à questão “por que haverá aumento no custeio dos serviços prestados”, Benitez, da Connexxion, destaca que a perda da flexibilidade na gestão da jornada dos motoristas em relação aos critérios de descanso vai demandar mais motoristas e veículos e, consequentemente, mais custos. A remuneração de 100% conforme CLT no tempo de espera em filas para carga, descarga e fiscalização, que antes era de 30%, através de indenização, gerarão mais custos a cadeia. O transit time nas viagens de longa distância deve aumentar de uma maneira geral, impactando no planejamento dos estoques e, consequentemente, gerando mais custos para a cadeia. “Além do custo direto com o pagamento do tempo em fila igual ao efetivamente trabalhado, as viagens de ponto a ponto serão mais lentas, pois o tempo de efetivo tráfego, em cada jornada do motorista, será menor, já que o tempo em fila passa a ser considerado na jornada diária e nos seus limites legais”, completa a coordenadora da área trabalhista consultiva e contenciosa da GBA Advogados Associados.

Ainda dentro desta questão, Neme, da Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso, ressalta que, com as alterações na legislação, uma viagem que anteriormente era feita em dois dias poderá levar até quatro dias, o que, por sua vez, acarreta o aumento no custo do transporte como um todo.

Lucas Batista Fernandes, responsável pelo departamento jurídico e gestor administrativo do Grupo IBL, também aponta que teremos impacto nos custos de espera, tempo de trânsito da carga e, consequentemente, na cadeia de suprimentos. Desta forma, as indústrias precisão de maiores estoques, mais equipamentos, como empilhadeiras e funcionários, além de haver aumento na conta de luz, entre outros.

Meyer, do Instituto Cordial, avalia que provavelmente haverá um aumento no custeio dos serviços porque parte das horas de descanso e de espera dos motoristas, que antes não eram contabilizadas ou eram subvalorizadas na composição dos custos de transporte, passam a ter maior peso nessa composição. Em outras palavras, o que antes era arcado pelos profissionais, que podiam passar horas esperando por carga e descarga sem que esse tempo fosse considerado parte de sua jornada de trabalho, passa a ser arcado no custo do serviço, inclusive passando esse tempo a ser remunerado como valor-hora normal de trabalho, e não em ⅓, como era antes.

“O aumento no custeio dos serviços prestados ocorrerá em virtude da oneração operacional da atividade da logística, já que, com as novas regras da jornada de trabalho, os motoristas terão uma jornada de trabalho bem limitada, com pagamento de eventuais horas extras e adicionais”, ressalta, agora, Aline, da Martorelli Advogados.

Oliveira, do SETCEMG: “Agora, os remetentes e destinatários precisam reduzir o tempo de carga ou descarga, pois durante o tempo parado do veículo haverá custos que aumentam a operação do transporte”

O advogado Jeferson Costa de Oliveira, integrante do quadro social do escritório Paulo Teodoro Advogados Associados e assessor jurídico do SETCEMG – Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas e Logística de Minas Gerais, destaca, por sua vez, que os dispositivos da Lei 13.103/15 que foram declarados inconstitucionais permitiam que a jornada, o descanso diário e o repouso semanal fossem mais maleáveis, possibilitando a conclusão do transporte em menor tempo e o atendimento da demanda existente. Agora, o tempo das viagens será maior, haverá elevação dos gastos com diárias de viagem e horas trabalhadas, o número de viagens em uma determinada operação irá diminuir, haverá necessidade de aumentar a frota e o número de motoristas para atender as demandas; além de outras situações peculiares a cada operação, inclusive haverá reflexos indiretos, como aumento no número de empregados para cumprimento das cotas de menor aprendiz e de portadores de necessidades especiais – PNE’s, CIPA, normas regulamentadoras de medicina e segurança no trabalho, etc. 

“De fato, prevemos um impacto significativo nos custos operacionais da logística no país, devido ao aumento sobretudo dos custos com folha de pagamento”, completa Adilson Santos, diretor executivo do Grupo TGA – holding que controla as unidades TGA Logística, TGA Transportes (nacional) e Expresso TGA (internacional).

Mudanças – Já com relação às mudanças que deverão ocorrer, Benitez, da Connexxion, aponta repasse dos custos aos embarcadores, em função da ineficiência nos processos de carga e descarga (filas), maior infraestrutura nas rodovias para garantir paradas seguras e de qualidade para os motoristas e aumento da atratividade para a função de motoristas, que hoje já é restrita e com tendência de queda. A estas, Fernandes, do Grupo IBL, acrescenta: aumento de estoque, maior quantidade de veículos e motoristas no mercado, tempos de entrega maiores. E Depentor, do SETCESP, completa: as mudanças que deverão ocorrer são prolongamento no tempo de viagem, menor produtividade e aumento de mão de obra.

“Para tentar amenizar os impactos da alteração da legislação, os empregadores devem buscar ganhos na produtividade, principalmente aqueles relacionados à logística das suas operações, onde podemos citar, como exemplos, o agendamento de entregas, o que poderia resolver o problema do ‘tempo de espera’ na carga e descarga; revezamento de motoristas em rotas mais longas, o que mitigaria o pagamento de horas extras, dentre outras situações que devem ser objeto de minucioso estudo. Outra mudança que podemos citar é o possível aumento da terceirização de serviços, ou seja, a contratação de motoristas autônomos”, relaciona, agora, Neme, da Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso.

Já Meyer, do Instituto Cordial, acredita que as empresas irão buscar formas de equilibrar seus custos para manter os preços competitivos. Como é uma decisão que impacta todo o setor, é possível que a maior parte apresente aumentos de valor dos fretes, com aumentos menores em empresas que já tiverem uma gestão mais eficiente em seus processos logísticos e de distribuição de jornadas de trabalho e descanso de seus colaboradores. “As mudanças devem ser incrementais, com incorporação de novas tecnologias e aprimoramentos nos processos logísticos de forma que, gradualmente, os custos sejam reduzidos e os preços ajustados até que o mercado se reequilibre.”

Na visão de Aline, da Martorelli Advogados, a decisão do STF acarretará um maior custo operacional para as empresas que atuam no setor de logística, eis que o tempo de espera, tanto em relação à carga e descarga, como em relação às barreiras fiscais e alfandegárias, será considerado como jornada de trabalho efetiva do empregado. 

Assim, as empresas e empregadores em geral deverão alterar a rotina de trabalho dos caminhoneiros de seu quadro pessoal. Além da mudança quanto aos intervalos, as empresas deverão observar as questões quanto ao tempo de espera, que deverá ser integrado à jornada de trabalho e ser pago como hora extra, com os adicionais legais ou normativos. 

Além disso, continua a advogada da Martorelli Advogados, as empresas deverão observar as normas coletivas da categoria profissional de sua base de representação sindical. Uma saída para a melhor regulamentação do tempo de espera é a celebração de Acordo Coletivo de Trabalho com o sindicato dos empregados. 

“Acontecerão mudanças na operação do transporte – no número de viagens, cumprimento dos prazos de entregas, especialmente se o veículo for fiscalizado no curso da viagem no posto fiscal, necessidade de reorganizar as operações de carregamento e de descarregamento, etc. No trato com a mão de obra – insatisfação de trabalhadores em razão do descanso nas estradas e longe da família, jornada de trabalho, etc.; na forma de cobrança dos serviços – aumento dos custos com seguro, já que a quantidade de veículos e pessoas terá de aumentar; elevação do pagamento de diárias, salários, encargos tributários, previdenciários e trabalhistas, etc.; necessidade do cliente ou destinatário ajustar a redução dos tempos de carga e descarga, etc.” Alista de mudanças agora é de Oliveira, do SETCEMG.

Santos, do Grupo TGA, completa esta questão: o Brasil não possui infraestrutura adequada para cumprir com as exigências de descanso estabelecidas, o que pode gerar sérios problemas a curto prazo para toda a cadeia logística do país.

Impactos – Também é preciso considerar os impactos destas decisões para o consumidor final. Segundo o sócio-diretor da Connexxion, os “novos custos” gerados pelos transportadores aos embarcadores serão avaliados juntamente com uma nova malha logística proposta, e provavelmente seu resultado será repassado ao consumidor.

“O aumento do custo do transporte cria problema na cadeia produtiva como um todo, uma vez que o repasse acaba desembocando no consumidor final de uma forma ou de outra. É indiscutível que o custo variável do empregador, que dependerá das horas extras prestadas pelo empregado, será embutido no preço do serviço e da própria mercadoria que está sendo transportada. Logo, o consumidor final não sairá ileso”, acrescenta o advogado do escritório Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso.

Mirella, da GBA Advogados Associados, também concorda: dependendo das operações de transporte e logística, esta mudança tratará forte impacto no custo do frete, encarecendo a operação e, consequentemente, pressionando a inflação em toda a cadeia produtiva. “Com certeza, haverá aumento do valor do produto para o consumidor devido ao aumento de custo da cadeia de suprimentos e transporte”, também pondera Fernandes, do Grupo IBL.

Na verdade, o Brasil é um país muito dependente dos transportes rodoviários e o custo deste serviço é parte significativa do preço de diversos produtos. Sendo assim, é possível que o consumidor veja aumento de preços, especialmente daqueles produtos produzidos longe dos centros consumidores, com longos trajetos e vários pontos de carga e descarga em centros logísticos.

“O percentual dessa diferença vai depender de muitos fatores e não deve ser homogêneo, podendo ser imperceptível em produtos com margens maiores, onde a cadeia de valor pode incorporar diferenças no frete, eventualmente reduzindo margens ou ajustando outros custos, para manter a competitividade. Gradualmente as empresas do setor devem ajustar seus custos operacionais e estes valores podem ser alterados, mas é preciso estudos e monitoramento para verificar o impacto nos preços ao longo da cadeia até o consumidor final ao longo do tempo”, avalia Meyer, do Instituto Cordial.

Aline, da Martorelli Advogados, vai mais longe em sua análise: com a oneração do custo operacional da logística haverá, sem dúvida, a majoração do custo para o consumo e, por conseguinte, para as relações cíveis. O valor do frete, por exemplo, sofrerá aumento e, em sequência, a tributação incidirá de forma proporcional à majoração, o que poderá provocar uma reação de crise econômica em cadeia no setor de logística.

“Em razão do engessamento das operações de transporte e da necessidade de readaptar as estruturas operacionais, trabalhistas, comerciais e de relacionamento entre o transportador e os envolvidos na relação jurídica (contratante do serviço, remetente, destinatário, etc.) ao cumprimento da decisão do STF, o aumento dos custos do serviço de transporte acontecerá com seu repasse no valor do produto e levando ao aumento de preços para o consumidor final. Poderá ainda haver demora na entrega dos produtos”, adverte, agora, Oliveira, do SETCEMG.

Impactos

Segundo o SETCEMG, os impactos atingirão a indústria, o agronegócio e o comércio. Haverá necessidade de mais estoques, planejamento e compras com antecedência; os tempos de viagem serão maiores e imprevisíveis; a jornada será ininterrupta independentemente de estar aguardando carregamento ou descargas, parado em congestionamento, blitz ou bloqueio de pistas.

Os participantes desta matéria especial também comentam esta afirmativa.

Começando, Figueirôa Junior, da NTC & Logística, ressalta: “estamos de acordo com esta afirmativa, pois o transporte faz parte de uma cadeia produtiva e os impactos desta decisão do STF atingirá os embarcadores e destinatários da mercadoria e o consumidor final. Também estamos de acordo que os tempos de carga e descarga deverão ser objeto de renegociação com os embarcadores e as empresas de transporte de cargas e logística devem passar esses custos para os fretes para que possam preservar a sua saúde financeira”.

Benitez, da Connexxion, também alerta que, até que as novas malhas de transporte das empresas sejam redefinidas com as novas restrições, prazos e custos, e os contratos entre transportadores e embarcadores sejam revalidados, o setor sofrerá grande desequilíbrio, impactando em todos os setores econômicos.

“De fato, as consequências serão negativas para as empresas do setor, uma vez que o Projeto de Lei n° 4246/2012, que se transformou na Lei n° 13.103/2015, tinha por objetivo reduzir os custos da produção, bem como viabilizar a atividade tanto para o profissional, quanto para as empresas que prestam serviço de transporte de carga.” 

Ainda segundo Neme, da Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso, com a declaração de inconstitucionalidade de 11 pontos do referido Diploma, “a tendência agora é insegurança jurídica e, por corolário, menos injeção de capital no transporte rodoviário do país, uma vez que muitas empresas estão preocupadas em como farão para cumprir a legislação, sobretudo quando, em viagens de longa distância, o STF impossibilitou o fracionamento e a postergação do descanso semanal. Entendemos que, com as declarações de inconstitucionalidade, retorna-se ao maniqueísmo que divide empregados e empregadores em posições antagônicas, em prejuízo da negociação coletiva, da iniciativa privada, e sem considerar as peculiaridades do serviço”.

Sem sombra de dúvidas, um dos pontos mais afetados é a questão do planejamento das operações. “Nossa sugestão é para que as empresas já se adequem à nova realidade, admitindo as inconstitucionalidades declaradas pelo STF, pois isto não irá mais se alterar. Este é um fato novo que obriga a mudança logística das operações, revisão de custos, contratos com os clientes e tudo que se faz necessário, diante da nova ordem jurídica do segmento. Isto implicará uma revisão de todas as operações de transporte e logística, nas quais será necessário que transportadores, embarcadores e destinatários consigam melhorar a produtividade do segmento e rever suas rotinas”, aconselha, agora, Mirella, da GBA Advogados Associados.

Também para Aline, de Martorelli Advogados, com as novas regras da jornada de trabalho dos motoristas, haverá forte limitação nas atividades operacionais das empresas, que deverão observar o limite das horas diárias e semanais de trabalho fixadas pela decisão do STF. Desse modo, com a vedação da divisão dos descansos e com a obrigatoriedade de observância das trinta e cinco horas de repouso, junto com a integração do tempo de espera como jornada de trabalho efetiva, haverá maior guarda de estoques, com o planejamento de venda e de compras com antecedência. “Vai ter que haver um ajuste entre pedidos e estoque. Talvez não seja necessário aumentar o estoque, mas vai ser preciso fazer pedidos com mais frequência”, acrescenta Depentor, do SETCESP.

Em outro entendimento, Akira, do Grupo IBL, destaca que será necessário sim, mais estoque, uma vez que o tempo de entrega dos produtos aumentarão devido às mudanças generalizadas nas regras de jornada. Em suma, estima-se que os impactos financeiros, operacionais, tributários e econômicos refletirão em todos os segmentos do país, e não apenas no transporte rodoviário de cargas e de passageiros. “Tudo indica que haverá forte elevação nos custos das empresas que, necessariamente, deverá ser compensada com a renegociação dos contratos com clientes e parceiros de negócios e com a valoração dos serviços prestados em toda a cadeia operacional.”

Sendo o Brasil um país onde a logística depende do transporte rodoviário, a decisão de fato impacta boa parte dos setores que transportam carga no país, incluindo a indústria, o agronegócio e o comércio. Neste cenário em que a ADI retoma algumas exigências da CLT, as empresas transportadoras, em associação com as produtoras e comerciantes, passam a ter que garantir um planejamento logístico que envolverá, sim, as compras com antecedência e também maior controle do transporte e das cargas e descargas para evitar um aumento excessivo do custo operacional logístico.

Ainda na análise de Meyer, do Instituto Cordial, o que em um primeiro momento pode parecer negativo economicamente para as empresas têm potencial para gerar um impacto positivo para a segurança viária, e consequentemente para a saúde pública, para a qualidade de vida dos motoristas, para a sustentabilidade do setor logístico. “Toda transformação implica em adaptações para se chegar a um equilíbrio. Neste caso, o equilíbrio é entre as necessidades da sociedade, como a segurança viária e os direitos trabalhistas dos motoristas, e as necessidades do setor privado em manter um modelo de negócio rentável.”

Os tempos de viagem não necessariamente serão maiores ou imprevisíveis – continua o diretor de operações do Instituto Cordial. O planejamento estratégico com soluções eficientes pode trazer alternativas que garantam a segurança do trabalhador com o menor custo possível para a empresa, dentro da lei. É possível, por exemplo, rastrear o caminhão para verificar os tempos de espera para carga e descarga e identificar em quais momentos é possível que o processo seja mais eficiente e propor adaptações. Em casos de trajetos longos, de fato, o tempo de viagem será maior, se for feito com somente um motorista com os devidos tempos de descanso com o caminhão parado, em vez de dois motoristas alternarem a direção e o descanso. Para um processo mais sustentável do ponto de vista social e econômico, é fundamental que seja feito o registro, controle e acompanhamento do transporte logístico pelas empresas responsáveis para que tanto a empresa como o motorista possam se proteger diante de adversidades.

“As definições da ADI garantem a segurança dos motoristas enquanto trabalhadores e a segurança no trânsito de toda a sociedade. É importante reforçar a importância de que a Lei do Motorista esteja dentro dos limites constitucionais e da CLT. As jornadas de trabalho não podem, nem devem ser ininterruptas. As horas de trabalho, horas extras e horas de descanso previstas na lei devem ser seguidas. Porém, sim, existem ocasiões em que imprevistos levarão ao aumento de tempo de jornadas logísticas e será necessário buscar alternativas para lidar com essas situações e garantir que sejam a exceção e não a regra. E que essas alternativas sempre estejam também dentro da lei”, explica Meyer.

A lei de 2015 permitia, através da liberação do revezamento de direção entre dois motoristas e do fracionamento do descanso, que houvesse certa emenda de trabalhos levando a jornadas exaustivas que podem provocar acidentes graves e fatais. Dessa forma, se destacava a fragilidade do motorista como elo mais fraco da relação de trabalho e também como uma potencial vítima do trânsito. Porém, vale mencionar que tanto a possibilidade de estender a jornada até que seja encontrado um ponto seguro e adequado para descanso como a obrigatoriedade de exame toxicológico, ambos presentes na lei de 2015, foram consideradas constitucionais e, portanto, foram mantidas e também colaboram para a segurança de todos, completa o diretor de operações do Instituto Cordial.

Caminhões como armazém

Ainda segundo o SETCEMG, tempos de carga e descarga deverão fazer parte complementar de tarifas, penalizando aqueles que fazem dos caminhões armazém ou garantia de atendimento, segurando veículos por horas, às vezes dias, para carregar ou descarregar. É necessária cobrança por tempo parado do veículo e dos colaboradores.

Benitez, da Connexxion, concorda com esta avaliação. Segundo ele, o tempo parado em filas para carga ou descarga é ocasionado por total ineficiência na cadeia de suprimentos, especialmente em grandes Centros de Distribuição. Grandes embarcadores “sufocam” os transportadores com cláusulas de franquia relacionadas ao tempo de espera, fazendo com que a cobrança hoje praticamente não exista. Com a revisão, o valor aumentará consideravelmente, e o repasse será inevitável.

“Como dito anteriormente, como exemplo, o ‘tempo de espera’, após a decisão do Supremo Tribunal Federal, passa a compor a jornada de trabalho dos motoristas profissionais, sendo que, eventuais horas extras decorrentes desse ‘tempo de espera’ não mais serão remuneradas à base de 30% do salário-hora normal, mas com adicional mínimo de 50%. Logo, a inflação atingirá todos os envolvidos nessa logística, e, inevitavelmente, as transportadoras serão as mais prejudicadas, e elas, para compensar os gastos, tenderão a incluir, entre as tarifas que já cobram, o período parado do veículo e dos colaboradores, sob pena de tornar insustentável a manutenção da sua atividade econômica. Portanto, a tendente majoração dos custos dos colaboradores envolvidos nessa atividade provoca efeito cascata que encarece os serviços de forma pulverizada –dificilmente alguém não será atingido por essa inflação, principalmente o consumidor final”, avalia o advogado do escritório Bisson, Bortoloti, Moreno e Occaso.

Também para Akira, do Grupo IBL, este é um ponto onde será necessário um repasse de maneira correta e exata, considerando o tempo parado nos clientes, o qual hoje não é cobrado na totalidade. Desta forma, teremos também um aumento de custo no referente ao transporte que, consequentemente, será repassado ao consumidor final, onerando toda a cadeia de suprimentos. “Com as novas regras trazidas quanto à jornada de trabalho dos motoristas, inclusive no que tange ao tempo de espera, que passa a integrar a jornada de trabalho, a carga e a descarga deverá ser realizada de forma célere e cada vez mais imediata, haja vista a limitação das horas de trabalho dos motoristas. Em virtude disso, como meio de assegurar eventuais custos de horas extras, as tarifas passarão a incluir eventuais dispêndios na carga e na descarga, bem como do tempo parado do veículo e dos motoristas”, completa Aline, da Martorelli Advogados. Ou, como lembra Depentor, do SETCESP, é necessário, sim, que a transportadora faça a precificação e cobre o armazenamento dentro do veículo, nos casos em que o motorista chegou no local e não descarregou o veículo.

Oliveira, do SETCEMG, também lembra que os tempos de carga e descarga atualmente não têm previsão de início, nem de término, apenas a informação do remetente ou destinatário para que o veículo fique à disposição e servindo de armazém. “Agora, os remetentes e destinatários precisam reduzir o tempo de carga ou descarga, pois durante o tempo parado do veículo haverá custos que aumentam a operação do transporte (direitos trabalhistas dos motoristas à disposição – horas normais, horas extras, adicionais noturnos, diárias de viagem, etc. –; veículo parado, aumento do tempo do transporte, etc.).”

Conforme a própria lei nº 13.103 de 2015, em concordância com a lei nº 11.442 de 2007, o prazo máximo para carga e descarga deve ser de cinco horas e, caso esse tempo seja excedido, o transportador autônomo ou a empresa transportadora deverão ser compensados financeiramente. Portanto, o tempo de espera que ultrapassa o previsto pela lei acarretará em uma tarifa complementar que deverá ser assumida pelo embarcador em caso de carga e pelo destinatário em caso de descarga.

Meyer, do Instituto Cordial, continua: as cobranças referentes aos momentos em que o veículo e os colaboradores estão parados dependerá do contexto. A jornada de trabalho dos motoristas, conforme a ADI, deverá respeitar a CLT e, portanto, deverá cumprir com as horas previstas para trabalho, horas extras e horas de descanso. O “tempo de espera” em que o motorista está esperando na fila para carregar ou descarregar e que está cuidando do caminhão configura, segundo a ADI, como horário de trabalho.

Uma vez que o motorista contratado através do regime CLT passa a receber como hora trabalhada nos chamados “tempos de espera”, as empresas transportadoras possivelmente terão um cuidado maior em garantir agilidade na carga e descarga para otimizar os custos operacionais e compartilhar essa responsabilidade com os embarcadores e destinatários ao rastrear os caminhões, registrar o tempo de espera e cobrar por possíveis atrasos.

“A tendência, portanto, nos casos de empresas transportadoras com motoristas contratados em regime CLT, é um maior controle dos tempos de carga, transporte e descarga, por exemplo através do rastreamento dos veículos, para manter tanto a otimização financeira quanto a segurança viária. E, para o sistema logístico como um todo, se fará necessário um planejamento mais eficiente das operações para evitar o aumento excessivo de gastos da empresa transportadora.”

Os motoristas, por sua vez – completa o diretor de operações do Instituto Cordial – têm o direito e o dever de conhecer a ADI, entender suas motivações e realizar seu trabalho alinhado a ela. Para isso, o próprio setor de recursos humanos das empresas transportadoras tem um papel fundamental para que a informação e compreensão das novidades da lei do motorista sejam conhecidas e compreendidas por todos os envolvidos.