Mistura pacífica
Embarcadores e transportadores unem forças para atender as rígidas exigências da legislação e obter ganhos de eficiência da cadeia produtiva, como instrumento de competitividade.
Apesar da desaceleração do ritmo da economia nacional, o setor de químicos registrou crescimento dos volumes de produção e vendas internas no segundo semestre do ano. No acumulado do ano, o RAC (Relatório de Acompanhamento Conjuntural), da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), indica alta de 4,91% no índice de produção e de 8,26% no de vendas internas, o melhor dos últimos cinco anos.
Com a produção em alta, aumenta na mesma proporção a demanda por fornecedores de serviços de transportes especializados em cargas químicas. Aqueles com experiência comprovada são disputados pelos embarcadores, uma vez que o conhecimento da operação figura como um dos principais critérios de escolha. “Procuramos transportadoras com experiência, licenças e autorizações, além de motoristas capacitados e veículos/equipamentos adequados para esse fim. Trata-se da modalidade de transporte mais sujeita à legislação, com um extenso check list como parte das exigências legais”, explica o responsável pela administração de armazém da CHT Brasil Química, Cássio Aparecido Finamor.
Cássio conta que, no caso de sua empresa, especializada em produtos químicos auxiliares têxteis, o comportamento do segmento não acompanhou a alta geral do setor, uma vez que o desempenho das indústrias têxteis nacionais sofreu impacto negativo das importações originárias basicamente da Ásia. “De qualquer forma, existe um tímido otimismo com as ações que o governo vem incorporando e que podem ter resultado favorável já no segundo semestre do ano, de modo a nos permitir outros resultados”, espera Finamor.
PARCERIAS DE LONGA DATA
Com uma dinâmica tão particular quanto a dos produtos farmacêuticos, com rígidas exigências em relação a certificações e procedimentos, é natural que perdurem no segmento químico as relações bem-sucedidas entre embarcadores e transportadores, onde a familiaridade pode fazer toda a diferença. “Nossos parceiros já têm algum tempo conosco: o mais novo, por exemplo, nos presta serviços há cerca de dez anos. Isso não significa, porém, que não sejam periodicamente avaliados, pois temos as certificações ISO 9001 e 14.001 e acompanhamos de perto as alterações e as necessidades do mercado.”
Finamor resume as expectativas da indústria química, no trato com esses fornecedores. “O que se espera de um transportador que atenda ao setor é preço, prazo, competência, capacitação técnica e boa relação com as necessidades específicas dos clientes. Jogo de cintura para conviver com as dificuldades do trânsito e com as restrições também é muito apreciado”, avisa o representante da Finamor.
Com gerente de Planejamento e Logística da Arysta LifeScience, Wagner Cecilio da Silva, acredita que a expectativa sobre o transportador se sofisticou na mesma proporção da complexidade da cadeia de produção e distribuição do setor. “Hoje, as empresas de transportes precisam ter planos robustos de gerenciamento de risco já implementados e não podem abrir mão de rigorosas premissas de saúde, segurança e meio ambiente, devido às características dos produtos. Por sua vez, tudo deve ocorrer sem onerar o frete, visto que se trata de um mercado altamente competitivo. A gestão da informação também é muito crítica e merece toda a atenção, pois um produtor aguarda nosso produto para aplicar na época correta.”
PRÉ-REQUISITOS
Cecilio faz coro com seu colega da CHT Brasil Química, ao esperar o máximo de eficiência e segurança das empresas transportadoras. Tanto nos serviços oferecidos quanto (e especialmente) dos profissionais envolvidos nas operações. “Queremos pessoal treinado e equipamentos adequados, associados a premissas operacionais e legais muito fortes, além de um relacionamento aberto e constante em busca de soluções conjuntas. Alguns pré-requisitos de saúde e segurança também são imprescindíveis. Como é o caso da aplicação nos motoristas de exames periódicos e suplementares aos exigidos por lei, aferição sistemática dos tacógrafos para controle da velocidade e análise rígida dos discos são alguns pontos primordiais para a sustentabilidade da atividade.”
Na visão do gerente da Arysta LifeScience, decididamente, a escolha de um transportador depende do cumprimento dos requisitos operacionais – como rastreamento, lead times competitivos e informação – e das exigências de saúde, segurança e meio ambiente. “As operações efetuadas neste setor devem ser feitas com base em uma grande variedade de licenças e certificações especiais. São necessários também equipamentos especiais e profissionais especialmente treinados. Além do curso MOPP (Movimentação de Produtos Perigosos), o motorista deve ter conhecimentos específicos relativos aos produtos transportados, para que possa responder adequadamente a situações de emergência”, diz. Ele ainda acrescenta: “É fundamental que o motorista conheça a legislação de produtos perigosos e tenha plena consciência de sua responsabilidade na preservação e proteção ao meio ambiente”.
LINHA DE CORTE
Se, em outros tempos, o fator custo era o que orientava o embarcador, na hora de escolher um fornecedor de transportes, hoje a escolha é bem mais criteriosa. No processo de apuração para o Prêmio Top do Transporte, identificou-se que o setor químico dá a mesma importância à relação custo–benefício e ao nível de serviços, seguidos por capacidade de negociação, gestão de qualidade e, finalmente, a tecnologia de informações. Silva, da Arysta LifeScience, explica o motivo: “O foco anteriormente 100% direcionado ao custo deu lugar a uma ‘linha de corte’ que desclassifica as transportadoras sem nível de qualidade do serviço. É preciso considerar o profissionalismo e a capacitação no exercício dessa função. Isso ocorre devido à especificidade de nossas cargas e aos requisitos demandados, associados a um mercado que reúne grandes players a disputar os mesmos clientes”.
Para ele, nos dias atuais, a logística assumiu o papel de instrumento de competitividade dentro da área química. “Por isso, é fundamental que o operador logístico atue com firmeza e que os controles sejam efetivamente rígidos e medidos como forma de desempenho. Redução de gastos e desperdícios com retrabalhos decorrentes de armazenagem não qualificada têm impacto direto no desempenho global com a diminuição dos custos gerais da atividade.”
Com efeito, a maior flexibilidade e custos menores são a contribuição mais importante das transportadoras para o ganho de eficiência da cadeia produtiva do setor químico, segundo afirmação da gerente de logística para a América Latina da Chemtura Indústria Química do Brasil, Mônica V. Fanucchi. Ela alerta para o fato de que, mesmo com resultados positivos, a indústria química vem reagindo às mudanças impostas pelo mercado. “Atuamos nos mercados agroquímico e químico e 2012 tem sido um ano extremamente difícil por vários fatores. E destaco o aumento de cargas fracionadas e a concentração de faturamento nos últimos dias do mês, além do impacto da nova lei dos motoristas sobre os prazos de entrega e o consequente aumento de tarifas”, confessa. Mônica acredita que tal situação deve se manter, já que “o fracionamento de cargas e a nova lei dos motoristas vieram para ficar. Os clientes não querem mais arcar com o custo de inventário, que acabou transferido para a indústria. A nova lei dos motoristas já é realidade em outros países, mas evidentemente as transportadoras não estavam preparadas, o que vem influenciando a qualidade dos serviços prestados”, reclama a gerente.
SONHO DE CONSUMO
Com a característica do fracionamento de cargas, a seleção de fornecedores de serviços de transportes leva em consideração critérios como preço, qualidade do serviço, atendimento à legislação e prazo de entrega. Mônica alerta para o nível de serviço prestado pelas empresas brasileiras: “Mesmo trabalhando com empresas “Top”, ainda há muito caminho a ser percorrido, principalmente na troca de informações via EDI. O conhecimento eletrônico melhorou um pouco a situação, mas trata-se de uma área que ainda pode ser mais explorada. Nosso ‘sonho de consumo’ seria que a empresa visse em nosso sistema o faturamento do dia e já enviasse os caminhões, sem que tivéssemos de solicitar por telefone”, diz.
Nelson A. Coelho Pereira, da Lumen Quimica, destaca que o transporte químico se caracteriza, principalmente, pela necessidade de segurança no deslocamento da carga. “Até pouco tempo atrás, os caminhoneiros não sabiam o produto que estavam transportando. Com a exigência de cursos, seminários e preparação desses profissionais, hoje já é possível tomar cuidados básicos com esta modalidade de transporte.” Segundo ele, nota-se também uma nova postura das empresas de transportes, que passaram a investir em uma logística mais sustentável. “É isso o que se espera de um transportador de carga química. De nada adiantaria produzirmos com todo o cuidado ambiental para depois o transportador “jogar” a carga por aí sem o menor cuidado ou ‘aparato’ necessário”, conclui.
À espera do 2º semestre
Para a Arysta LifeScience, a boa fase nos campos brasileiros vem ocasionando um elevado crescimento ao segmento da indústria química. Notadamente, nas operações orientadas ao agronegócio, caso da companhia. “Os volumes de negócios realizados e de cargas transportadas realmente cresceram. Já a elevação dos custos diminuiu as margens, o que exige ainda mais competitividade do setor. Por enquanto, porém, não é possível falar sobre flutuação de demanda, já que os volumes comercializados no agronegócio se concentram no segundo semestre”, explica o gerente de Planejamento e Logística da empresa, Wagner Cecilio da Silva.
Diferencial competitivo
Uma das certificações mais conhecidas do setor químico para o transporte rodoviário é o Sassmaq (Sistema de Avaliação, Saúde, Meio Ambiente e Qualidade), que possibilita avaliar o desempenho das empresas que prestam serviços à indústria química. A avaliação das empresas é feita por organismos certificadores independentes credenciados pela Abiquim. São avaliados os “elementos centrais”, compostos pelos aspectos administrativos, financeiros e sociais da empresa, bem como os “elementos específicos”, constituídos pelos serviços oferecidos e pela estrutura operacional. Mesmo não sendo obrigatória, a avaliação Sassmaq virou um diferencial competitivo entre as empresas e passou a ser adotada como regra também para os embarcadores contratantes de serviços de transporte.
O primeiro módulo a ser elaborado foi justamente o rodoviário, mas o sistema contempla também questões relacionadas a estação de limpeza, transporte ferroviário, atendimento a emergências e outros em implantação. No caso rodoviário, está dirigido a transportadoras e operadoras logísticas. Em março de 2005 ficou definido que as associadas à Abiquim, signatárias do Programa Atuação Responsável, passariam a contratar unicamente empresas avaliadas pelo Sassmaq para o transporte rodoviário de produtos químicos a granel. Desde janeiro de 2006, esse compromisso foi estendido ao transporte rodoviário de produtos químicos embalados.
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