Foi oficialmente registrada em novembro no Brasil a maior temperatura deste ano: o município mineiro de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, a 678 km de Belo Horizonte, alcançou uma marca histórica de 44,8°C conforme apontado pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
Os dados analisados indicam que este verão pode ser um dos mais quentes da história, marcando o auge do El Niño. A cidade de São Paulo, por exemplo, registrou a sua maior temperatura de 2023, atingindo 36,9°C, sendo considerada a temperatura mais elevada já registrada para o mês desde o início das medições do Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (CGE), da prefeitura, há 19 anos.
Com esse cenário se desenvolvendo, as pretensões climáticas podem afetar diretamente um setor responsável pela maior movimentação de mercadorias no país: o transporte rodoviário de cargas.
Segundo Eduardo Leal, secretário-executivo da Associação Brasileira de Transporte e Logística de Produtos Perigosos (ABTLP), cada um dos mais de 2.000 produtos classificados possui suas particularidades, com características únicas que devem ser observadas durante o deslocamento. Em períodos extremamente quentes, alguns produtos podem acarretar riscos como combustão espontânea, aumento da pressão nos recipientes, degradação da embalagem e até possíveis vazamentos.
“É crucial contar com embalagens homologadas para eliminar tais riscos, além de realizar inspeções regulares em veículos e em equipamentos. Essas medidas priorizam a segurança, preservando tanto o meio ambiente quanto a saúde pública”, ressalta Leal.
A associação está concentrando seus esforços no compartilhamento de conhecimento, na elaboração de diretrizes precisas e na formulação de planos de emergência colaborativos, buscando enfrentar os riscos vinculados ao transporte e ao armazenamento de produtos perigosos em condições de altas temperaturas.
“A ABTLP desempenha um papel crucial ao disponibilizar informações detalhadas e diretrizes específicas que capacitam os profissionais do setor a lidar com as operações de transporte sob condições de temperatura elevada. Disponibilizando um conhecimento especializado, a associação desempenha um papel direto na proteção dos profissionais ligados ao transporte, mitigando os riscos de acidentes e de incidentes e realizando a operação com máxima segurança”, reforça o executivo.
Clima elevado prejudica o agronegócio da região Sul
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou recentemente seu primeiro prognóstico para a safra de 2024 e estimou 308,5 milhões de toneladas em grãos, cereais e leguminosas. Caso se confirme, a produção deverá ser 2,8% inferior à deste ano.
Apesar de este ano obter recordes na balança comercial, impulsionados pela grande movimentação na exportação de mercadorias, o setor produtivo seguiu enfrentando sérios desafios climáticos que assolaram o país devido às chuvas intensas e ao calor excessivo.
Franco Gonçalves, gerente administrativo da TKE Logística – empresa especializada no transporte de produtos alimentícios –, traz uma retrospectiva do que foi essa temporada e de como o clima vem impactando o desenvolvimento do setor e, principalmente, da economia do país.
“O momento está sendo marcado pelos efeitos do El Niño; no entanto, na região Sul do Brasil, estamos vivendo um volume de chuvas acima da média, o que tem gerado erosão nas estradas, impossibilidade de acessos às fazendas, quedas de barreiras e de pontes e outras situações que, quando impossibilitam a operação, acabam aumentando os custos envolvidos, como o financeiro, além do cronograma”, pondera o executivo.
Já em situações intensas, como o calor excessivo, as empresas do setor buscam se organizar e implementar iniciativas que auxiliem os motoristas, que são aqueles que estão na linha de frente. Franco destaca que, além de os caminhões de sua empresa conterem tecnologias modernas para auxiliá-los, o bem-estar e a saúde dos colaboradores também está em foco, especialmente em épocas mais quentes.
“Além do ar-condicionado e do interclima existentes nos caminhões, em nosso processo de renovação de frota incluímos geladeiras dentro da cabine para os motoristas obterem um pouco mais de conforto e conseguirem algo refrigerado durante a viagem. É sempre indicado também cuidar da exposição excessiva ao sol, do consumo adequado de água e dos alimentos guardados, que se deterioram com mais facilidade no calor e podem provocar doenças. São esses os cuidados essenciais que precisamos ter”, relata Gonçalves.
Manutenção de frota
Os fenômenos climáticos causam grande impacto diretamente nas mercadorias e na saúde das pessoas; por outro lado, o agravante também surge nas ferramentas de trabalho no segmento do transporte, se tratando do desgaste dos caminhões.
Marcel Zorzin, diretor operacional da Zorzin Logística, destaca os desafios enfrentados nos últimos meses, visto que o setor é responsável por mais de 65% do transporte de mercadorias no país, ou seja, grande parte da movimentação de veículos nas malhas rodoviárias é de carretas.
“Sem dúvidas, o maior prejudicado são os veículos, especialmente os pneus. Com as altas temperaturas do asfalto, a banda de rodagem aquece e acaba amolecendo, como se fosse uma borracha, causando um desgaste maior do que o normal. Apesar de a maioria dos pneus atuais ser tropicalizada no Brasil, ainda existe essa preocupação”, comenta o executivo. “Consequentemente, isso afeta outras estruturas dos caminhões, como alinhamento e peças, dentre outros componentes, o que influencia diretamente no desempenho do trabalho”, comenta o executivo.
Os dados mostram que as mudanças climáticas mais intensas vêm causando sérios riscos dentro do transporte. Para isso, as organizações e as entidades buscam movimentações para amenizar os impactos.
“Temos mapeado todas essas questões e tentando administrar os problemas da melhor maneira possível. Internamente, na Zorzin, trabalhamos com uma gestão de frota eficiente, contemplando os veículos com pneus novos e de alta qualidade para que tanto os motoristas quanto os nossos parceiros comerciais não sejam prejudicados. É uma tarefa complicada, mas precisa ser parte do nosso escopo de trabalho”, finaliza Marcel Zorzin.