Foi entusiasmante o evento de lançamento da PILT – Plataforma de Infraestrutura em Logística de Transportes. Em uma época que é tão fácil expor críticas sem muito – ou nenhum – critério, e jogar no colo do próximo a responsabilidade de mudanças, a FDC – Fundação Dom Cabral (Fone: 0800 9419200) mostrou que pode fazer mais, muito mais.
O PILT é um centro de estudos avançados em infraestrutura de logística de transportes apoiado por ferramentas dinâmicas para diagnosticar, analisar e projetar a logística dos transportes, fomentando projetos de longo prazo, tanto da iniciativa privada quanto de governos, em todos os modais. “A existência de um centro técnico avançado qualifica o debate entre o investidor e o Poder Público. A qualificação das discussões reduz a assimetria de informações hoje predominante no Brasil”, ressaltou Paulo Resende, diretor da PILT/FDC e coordenador do Núcleo de Logística, Infraestrutura e Supply Chain da Fundação Dom Cabral, durante o lançamento, que aconteceu no dia 21 de junho último, em São Paulo.
O centro de estudos está localizado no Campus Aloysio Faria da FDC, em Nova Lima, MG. Nele, os técnicos trabalham com computadores de alta capacidade e softwares que permitem obter dados georreferenciados. As informações são fornecidas pelas entidades parceiras, como Ministério dos Transportes, ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres, IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e EPL – Empresa de Planejamento e Logística. Vale lembrar que entre suas premissas estão o rigor técnico aplicado e a imparcialidade dos resultados obtidos.
Aberta a qualquer usuário de internet, a PILT está hospedada no portal da FDC, o que permite estudos acadêmicos sobre infraestrutura de transportes e o monitoramento de projetos, de forma independente da alternância de governos. Ela é hoje, no Brasil, a plataforma com a maior inserção de dados sobre infraestrutura de transportes, pois cruza distintas bases no conceito de big data analitics para produzir bancos de dados georreferenciados e simulações multivariadas.
A ferramenta tem um grande potencial e será apresentada no exterior, provavelmente nos Estados Unidos, em setembro deste ano.
Na prática
De fato, a notícia é entusiasmante, mas a primeira análise feita pela plataforma não é nada animadora. Pelo contrário: é alarmante. O Estudo Diagnóstico e Projeções para a Infraestrutura de Logística de Transportes no Brasil revelou que os 195,2 mil km de rodovias brasileiras respondem hoje pela maior parte do transporte de cargas no país (54% segundo o governo federal), seguidos por 26,4% de participação das ferrovias, 16,5% de aquaviário e 3,1% de dutoviário.
Essa alta concentração de movimentos pelas estradas tornam o caminhão o principal veículo de escoamento de cargas, o que reduz a competitividade do produto brasileiro e faz a nação suscetível ao desabastecimento em momentos de crise. Esses dados podem não ser novidade para o setor, mas o que importa é: esse quadro tem condições de ser alterado, de forma significativa? É aí que vem a análise em longo prazo feita pela PILT: considerando o horizonte de 2035 e as perspectivas atuais de investimento, não.
Mesmo os expressivos projetos governamentais previstos para o país (a exemplo da Transnordestina Norte-Sul, que ligará Ouro Verde, GO, é chegará a Estrela d´Oeste, São Paulo, em execução) e a Ferrogrão (prevista para conectar os Estados de Mato Grosso e Pará), ainda em edital, por exemplo, não darão conta de alterações drásticas na matriz de transporte nacional, que tornariam a distribuição entre os modais mais equilibrada.
Até 2025, as ferrovias, de fato, têm oportunidade de avançar sua representatividade de 26% para 29,5%, mas esse fôlego terá sido diluído nos dez anos posteriores. E, em 2035, as rodovias voltam a responder por 52% do transporte de cargas em toneladas. Para complicar, já em 2025, cerca de 50% das estradas brasileiras vão estar em péssimas ou inaceitáveis condições de conforto e conveniência.
Para chegar a essas conclusões, os pesquisadores da PILT/FDC consideraram distintas fontes de informações e dados de referência para projeções sobre crescimento populacional e análise do impacto de investimentos programados.
“Continuaremos em um país sobre rodas se não houver um plano nacional, de prioridade do Estado brasileiro, de infraestrutura de transporte para o Brasil, suficientemente forte e ousado para não só melhorar a qualidade das rodovias, como também para ampliar o potencial das ferrovias, hidrovias e transporte de cabotagem”, afirmou Resende.
Estima-se que no período de 2015 a 2035 a evolução do volume de produção de cargas irá crescer 36,8% e a de transporte em toneladas, 43,7%. O estudo analisou também o crescimento conforme o perfil das cargas, sendo as de caráter geral as que mais circularão por rodovias.
O grave problema é que esse modelo perpetua a baixa competitividade dos produtos brasileiros. “Uma grande preocupação é que o mercado interno se expande na direção do interior do país. Além disso, os caminhões percorrem longas distâncias nas estradas brasileiras acima da média mundial, transportando cargas gerais.” E isso se agrava mais: “Aqui se aponta, pela primeira vez no Brasil, uma questão crucial para os caminhões: eles andam, em média 1.114 km por viagem com cargas gerais, quando, em países desenvolvidos de dimensões continentais, esse valor está em torno de 400 km para cargas de mesma natureza.”
Para Resende, o valor atual dos estoques de infraestrutura de transportes exige programas robustos e sustentados de investimentos em conservação da malha existente. Os custos logísticos crescentes consomem a margem das cadeias produtivas e, consequentemente, sua competitividade ou seu potencial de investimentos. A projeção da demanda, associada aos novos projetos, exige investimentos de longo prazo e protegidos dos programas conectados com agendas políticas de curto prazo.