Na última década, ao passo que a tecnologia se desenvolveu, os consumidores alteraram o seu comportamento de compra. Essas mudanças são percebidas por meio do “efeito chicote” (bullwip effect), que faz com que as perturbações da demanda afetem todos os elos predecessores da cadeia de suprimentos.
Vamos entender. Para as relações B2B, a gestão de fornecedores desenvolveu-se com a melhoria dos softwares de previsão de demanda e reabastecimento, bem como com a difusão do pensamento enxuto (Lean Thinking), entre outros. Dessa forma, os lotes de compra estratégicos não são tão grandes quanto eram em 1980. Já nas relações B2C, com o crescimento do e-commerce, a frequência de compras e o tamanho do pedido têm sido menores. Logo, os desafios do reabastecimento das lojas e da estratégia de “last mile” são mais complexos para os gestores de logística.
Por outro lado, o aumento da competitividade das empresas nesse mundo globalizado e informatizado faz com que os executivos busquem ações para promover a redução das despesas logísticas, a fim de obter uma posição de destaque frente aos concorrentes. Isso pode ser traduzido para o profissional de logística pela expressão “fazer mais com menos”! Aí começam os cortes de pessoal, as pressões por fretes menores, as brigas internas entre departamentos para “encontrar o culpado”… enfim, todos sabemos como isso acaba: um ciclo de melhoria – ou seja, redução dos custos – seguido de um novo ciclo de reestruturação – para recuperar o que foi perdido. Será que esse é realmente o caminho mais assertivo?
Vamos pensar. Toda empresa necessita reduzir os custos e melhorar sua performance de entrega. Contudo, a partir do momento que as tecnologias de fabricação estão cada vez mais semelhantes, a logística passa a ocupar uma posição de destaque no novo mundo dos negócios, pois é através da melhor gestão e planejamento dos processos logísticos que é possível atingir um melhor nível de satisfação dos clientes, bem como a tão desejada redução dos custos. Muito bem, gestão e planejamento são sempre as palavras de ordem, porém, muitas vezes esquecemos a etapa que a precede: o projeto.
É no projeto, ou redesenho, que conseguimos determinar para qual volume e perfil de demanda o sistema logístico está dimensionado e qual a despesa que ele deve entregar para a empresa. Na etapa do projeto também é possível encontrar a melhor configuração das instalações – fábricas, armazéns, Cross-Docking ou transit point – para atingir um determinado nível de serviço. Além disso, é justamente a etapa de projeto que possibilitará uma logística mais ágil e responsiva, tanto para a demanda atual, quanto para o plano de expansão da empresa nos próximos anos.
Portanto, por meio do projeto, ou redesenho, da malha logística é possível planejar o crescimento, determinar um nível de serviço a ser atingido, fazer uma projeção de despesas e definir a estratégia de fornecimento e abastecimento para todas as etapas da cadeia de suprimentos. Ademais, é esta etapa que possibilita encontrar o ponto de equilíbrio entre a redução das despesas logísticas e a melhoria do nível de serviço ao cliente.
Posto isso, a próxima pergunta é: como fazer o projeto ou redesenho da sua malha?
Uma malha logística possui uma série de parâmetros e restrições complexas que determinam o fluxo e as capacidades das instalações e transportes. Portanto, o mais adequado para se projetar uma malha logística é utilizar-se de métodos matemáticos de otimização. Para isso, existe no mercado alguns softwares especialistas para otimizar a malha logística, que normalmente utilizam a Programação Linear Inteira Mista. Por meio deles é possível encontrar a melhor localização para se abrir uma instalação, definir a política de estoque ideal para que não se tenha ruptura no ponto de venda e determinar o melhor modo de transporte, a fim de reduzir as despesas de distribuição.
Apesar de esse processo ser complexo, alguns pontos práticos são importantes para serem considerados em qualquer projeto da malha:
- Entenda a demanda que se deseja atender
Determine qual o melhor nível de agregação (em SKU ou família) que deve tratar a sua demanda. Em resumo, quando tratamos a demanda ao nível do SKU, os dados são mais granulares, mas o nível de complexidade para representação e interpretação do modelo pode ser mais complexo ou pouco significativo. Todavia, ao agregarmos os SKU por similaridade de demanda, por exemplo, família de produtos, há a perda da granularidade, mas a modelagem e os resultados podem gerar informações mais significativas. Logo, deve-se analisar a melhor forma de tratar a demanda, pois, nem sempre o nível SKU é o mais adequado, pois, com informações mais assertivas é possível tomar decisões sobre a política de estoque e alocação desse estoque nos armazéns.
- Não se esqueça do imposto
No Brasil, o turismo fiscal ainda é presente e pode determinar rotas de distribuição diferentes da menor distância entre a origem e o destino. Para reduzir o custo logístico total, pode ser necessário não utilizar a menor rota, a fim de que incentivos tributários sejam obtidos. Dessa forma, a abertura de armazéns avançados para a emissão de novos documentos fiscais pode fazer sentido para a redução do custo tributário e, consequentemente, reduzir o custo total para a empresa.
- Determine um nível e serviço para a malha logística
Como em todo estudo, é necessário determinar o que se pretende obter. No caso do redesenho da malha logística, é preciso entender os objetivos do negócio para criar uma estratégia operacional mais eficaz. Em resumo, deve-se determinar qual o nível de serviço ao cliente que deve ser atendido e em qual despesa, pois, esforços para melhoria do nível de serviço podem apresentar um trade-off entre o aumento de despesas e o aumento das vendas.
- Avalie soluções “make or buy”
Dado que estamos no projeto, é a hora mais adequada para considerar fazer ou terceirizar. Por meio de tomada de preços no mercado é possível inserir os valores para ambas as alternativas operacionais na modelagem, a fim de descobrir se fazer (insourcing) é mais vantajoso que terceirizar (outsourcing). No entanto, como esses valores podem ser preliminares, é fundamental uma análise de sensibilidade das soluções ao final do projeto.
- Não se esqueça das questões ambientais
Apesar de o Brasil ocupar uma posição de vanguarda quanto ao meio ambiente, sua estratégia de redução de gases do efeito estufa (GEE) está fortemente ligada ao desmatamento. No entanto, a “pegada de carbono” tem se tornado uma vertente importante para empresas que procuram crescer com sustentabilidade financeira, social e econômica (Triple Bottom Line). Além disso, o projeto de malha pode ser uma forma rápida para descobrir qual a dimensão de inventário de carbono que a sua empresa emite, a fim de buscar iniciativas de redução e conseguir comercializar os créditos gerados por meio de projetos certificados.
Os projetos de malha podem ajudar a empresa a reduzir custos na ordem de até 20% e a atingir melhores níveis de serviço. Além disso, apesar de se apresentar como um projeto logístico, torna-se uma iniciativa de toda a empresa, pois, para que ele seja realizado é importante o envolvimento de outras áreas (financeiro, fiscal, marketing, vendas, etc.) e, assim, faz com que a estratégia de operação para sustentar o crescimento da empresa seja mais assertiva e permita às operações logísticas atender a estratégia do negócio.
Rodrigo de Castro Barros
Mestre em Engenharia Mecânica e Engº de Produção, ambos pelo Centro Universitário FEI. Possui mais de 10 anos de experiência em Supply Chain & Logística, tendo atuado como gerente nas áreas de Operações, Planejamento Logístico e Melhoria Contínua em Operadores Logísticos, indústrias e varejo. Especialista na elaboração de planos estratégicos e táticos para operações, projeto e startup de CD, implantação de planejamento integrado, turnaround de operações e gestão de projetos de Lean 6 Sigma. É Gerente de Projetos de Supply Chain & Logística na Connexxion Brasil, atuando principalmente em projetos de malha logística, redenhos de CDs e no desenvolvimento de business case para novos negócios.